Oração!
Jesus, ao ensinar os discípulos a orar, os ensinou a pedir a vontade do Pai (Mt 6.10). O Espírito Santo, porque não sabemos orar como convém, intercede por nós falando o que Pai quer ouvir (Rm 8.27). E Deus só faz o que quer, porque quer sempre o melhor (Rm 12.2).
Talvez, diante dessa realidade, sejamos tentados a pensar: falar com quem só faz o que quer deixa pouco espaço para quem com ele fala. E então, embora essa seja a melhor maneira de compreender a profundidade da oração, parece que, para nós, só resta a frase atribuída a C.S. Lewis no filme Terra das Sombras: “Não oro para que Deus faça a minha vontade, mas para que eu seja adequado à vontade dele”.
Oração, portanto, é falar com quem quer sempre o melhor, e, por isso, só faz o que quer. E tem de ser assim, porque nós, seres humanos, a partir de nós, não sabemos o que devemos querer. Sem dúvida, não temos condição de saber o que é melhor, uma vez que nada sabemos do futuro, não interpretamos bem o passado, e, geralmente, somos atropelados pelo presente.
É possível, portanto, concluir que não vale a pena orar, ou que orar não faz sentido, se orar for entendido como levar um pedido, uma dor ou uma angústia ao Todo-Poderoso? Ou que orar só faz sentido se for para louvar, ou para abrir o coração como catarse, ou para confirmar a submissão à vontade do Pai?
Porém, antes de qualquer conclusão, consideremos: na cena apocalíptica, as orações dos servos do Cristo estão em taças de ouro e são postas pelos anciãos diante do Cordeiro vencedor (Ap 5.8). Há quem interprete que todo o desenrolar do Apocalipse é a resposta divina a essas orações. E os anciãos, no seu cântico, dizem que nós, os que cremos, somos sacerdotes que reinam na terra (Ap 5.10). E como sacerdotes reinariam, senão, por meio da oração?
Vejamos:
1- Abraão teve atendida uma oração que não conseguiu verbalizar. Porque Abraão, orando por Sodoma, pediu que Deus poupasse a cidade se lá encontrasse 10 justos, mas os anjos enviados por Deus para executar o juízo não encontraram tal contingente (Gn 18.16-33). Abraão, ao orar, lembrava-se de Ló. Deus salvou Ló por se lembrar de Abraão (Gn 19.29).
2- Moisés ordenou que o povo de Israel lutasse com os amalequitas porque haviam atacado a Israel. Moisés subiu à montanha para interceder por seu povo. Arão e Hur perceberam que era pela oração de Moisés que a batalha era vencida e sustentaram as suas mãos até Amaleque ser desbaratada (Ex 17.8-13).
3- Josué orou e Deus deteve o movimento do universo (Js 10.6-15). E que beleza a frase que sintetiza esse momento: "Não houve dia semelhante a este, nem antes nem depois dele, tendo o Senhor, assim, atendido à voz de um homem; porque o Senhor pelejava por Israel” (Js 10.14).
4- Ana, movida pela aflição e pelo excesso de ansiedade, orou por um filho. Eli, o Sumo Sacerdote, primeiro a julgou embriagada, mas quando a compreendeu, a abençoou. E Deus lhe concedeu um filho, Samuel, porque lembrou-se dela (1Sm 1.10-20).
5- Um anjo lutou 21 dias contra a potestade da Pérsia para atender a oração de Daniel. Disse o anjo: “foram ouvidas as tuas palavras; e, por causa das tuas palavras, é que eu vim (Dn 10.10-14).
6- Jesus, a pedido, fez um milagre antes da hora para manter um estado de festa (Jo 2. 1-11).
7- Jesus atendeu a uma mulher antes do tempo. Ainda não era o tempo do Senhor ser manifesto aos gentios, mas atendeu ao clamor de uma senhora sírio-fenícia e destacou que o fazia por causa da palavra que ela proferiu (Mc 7.24-30).
8- Jesus incitou aos seus discípulos a orar para que Deus permitisse que o inevitável, a chegada do abominável da desolação, acontecesse em tempo onde mais gente pudesse se salvar (Mt 24.15-22).
9- Jesus disse que se um juiz iníquo pode vir a atender a um clamor, quanto mais Deus que é justo (Lc 18.1-8).
10- Paulo orou contra o que havia visto e admoestado (At 27.21-24). Deus, por sua graça, salvou a todos que estavam em estado de morte certa, por tê-los dado ao seu servo, em resposta à sua oração.
Estes são alguns dos muitos exemplos que poderíamos citar!
Por princípio e definição todo desejo de orar é ímpeto para Deus, uma vez que nós, a partir da queda, não buscamos a Deus (Rm 3.11). Logo, qualquer oração, qualquer busca pelo transcendente é fruto da graça mantenedora da Trindade, que, por esta graça, pôs a eternidade no coração do homem, para que possamos alcançar algo da transcendência que é revelada pelas coisas criadas (Ec 3.11; Rm 1.19,20).
Claro, isso não garante que estamos orando da forma certa e nem para a pessoa certa, ou seja, não há garantia de que se esteja orando para a Trindade. Até porque a humanidade perverteu esse ímpeto por meio da idolatria, o que nos torna indesculpáveis (Rm 1.21-23).
No entanto, os que creram no Cristo, no qual a presença da eternidade no coração pela graciosa salvação encontrou plenamente a sua vocação, sabem que tal querer pela transcendência, assim como a possibilidade de experimentá-la, é resultado de operação divina em si, que em nós opera tanto o querer como o efetuar (Fp 2.13). E orar, que é demanda divina para nós (1Ts 5.17), é parte dos quereres que a Trindade opera e efetua em nós.
Deus só faz o que quer. E tem de ser assim, porque o melhor é sempre o que Deus quer. Mas vale a pena orar, não só para o diálogo necessário à vida devocional de submissão ao Pai (Mt 6.9-13), ou para pedir a sabedoria para o viver (Tg 1.5), ou para a intercessão necessária, diante da batalha espiritual (EF 6.18). Mas, também vale a pena orar a oração da ƒé (Tg 5.15), pois a oração do justo é eficaz e muito pode (Tg 5.16).
Vale a pena orar, por ser a forma como Deus escolheu atuar na história: Deus nada faz sem revelar a seus servos (Am 3.7), e o faz para suscitar intercessão, como o fez com Abraão (Gn 18.16-18). Foi como o apóstolo Paulo entendeu que deveria agir, a partir do discernimento que recebeu (At 27.21-24). Vale a pena orar diante de qualquer situação, porque o querer de Deus é mais extenso, abrangente e inclusivo do que qualquer ser humano é capaz de imaginar!
Fonte: Ultmato
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